Carmen dá tiro no pé e STF frustra a festa da Globo

Carmen dá tiro no pé e STF frustra a festa da Globo


A ministra Carmen Lúcia deu um tiro no pé. Não funcionaram as suas manobras para permitir a prisão de Lula. Primeiro, deixou de pautar a revisão da prisão em segunda instância, que poderia beneficiar o ex-presidente, preferindo colocar em discussão o habeas corpus impetrado pela defesa do líder petista. Ela imaginava que, diante das câmeras, os ministros não teriam coragem de votar a favor do HC que, naturalmente, seria negado. Perdeu de goleada: 7 x 4. Sete ministros não se intimidaram – Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Tóffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello – e votaram pela admissibilidade do habeas corpus. Os quatro que votaram contra foram Edson Fachin, relator; Luis Barroso, Luis Fux e a própria Carmen, os dois primeiros nomeados por Dilma e os dois últimos pelo próprio Lula. Se eles agem desse modo com o seu grande benfeitor, o que não farão com os outros?
A presidenta do Supremo não precisava votar, porque não houve empate, mas ela fez questão de registrar a sua posição contra Lula. E, após a derrota, tentou uma segunda manobra para permitir que o ex-presidente seja preso: suspendeu o julgamento, adiando a decisão final para o dia 4 de abril, após a Semana Santa. Como o Tribunal Regional Federal da 4ª. Região julga dia 26 os recursos do líder petista, e todo mundo sabe que serão negados, a sua prisão seria imediata. O seu advogado de defesa, Roberto Batocchio, no entanto, ao perceber a manobra requereu que a Corte emitisse um salvo-conduto, para impedir a prisão do seu cliente até o julgamento final do HC, o que foi concedido. Até o dia 4 de abril, portanto, Lula estará protegido da sanha dos que querem sua prisão, frustrando, pelo menos por enquanto, a festa da mídia, em especial da Globo, dos desembargadores do TRF-4 e da turma da Lava-Jato, à frente o juiz Sergio Moro.
Nesse interregno, porém, é preciso que os petistas, amigos e simpatizantes de Lula mudem o foco da discussão. De tanto a mídia golpista martelar nessa história da prisão iminente do ex-presidente, como se ele fosse um criminoso foragido, a sua possível privação de liberdade passou a ser encarada com certa naturalidade, como se fosse inexorável, fatal. E não é. Na verdade, a discussão deveria ser sobre a condenação, já que Lula não cometeu nenhum crime e, portanto, não há justificativa legal para que ele seja preso. Então, o que se deve discutir é a anulação da condenação, porque estribada sobre uma premissa falsa, já que o triplex do Guarujá, conforme exaustivamente comprovado, não é dele. Houve uma escandalosa armação, visível até da Lua, para impedir a sua candidatura à Presidência da República. Todo mundo sabe disso, inclusive os juízes do TRF-4 e do STJ, mas eles confirmaram e até ampliaram a pena sem qualquer motivo porque já estavam decididos, antes mesmo do processo chegar às suas mãos, a prendê-lo.
Por conta dessa expectativa, exaustivamente noticiada pela mídia golpista, ganhou grande importância a revisão, pelo Supremo Tribunal Federal, da questão da prisão após condenação em segunda instância, uma jurisprudência aprovada pelo próprio STF, com o voto de minerva da sua presidente, ministra Carmen Lúcia, que dividiu os seus ministros. Essa jurisprudência é flagrantemente inconstitucional, prejudicando centenas de prisioneiros, mas a presidenta da Suprema Corte se recusa a colocá-la em pauta, para reexame. Chegou a dizer que uma nova discussão da matéria apequenaria o Supremo mas, na verdade, foi apenas uma desculpa esfarrapada – e que lhe custou uma enxurrada de críticas – para não declarar o seu receio de que a mudança possa beneficiar o ex-presidente. A exemplo das outras instâncias do Judiciário que decidiram, independente de provas, eliminar o ex-presidente da vida pública, a presidenta da Corte Suprema também quer vê-lo atrás das grades.
A prisão de Lula, se vier a acontecer, além de uma escandalosa ilegalidade praticada pela própria Justiça, poderá desencadear uma onda de protestos, de consequências imprevisíveis, em todo o país. E a ministra Carmen Lúcia será a principal responsável pelos acontecimentos porque, ao curvar-se às pressões da Globo, que defende a prisão do ex-presidente, deixará de cumprir o seu dever constitucional de promover a reparação das injustiças praticadas pelas instâncias inferiores do Judiciário. Na verdade, todos os que contribuíram para essa situação são também responsáveis, mas a ministra, que se revelou autoritária ao ponto de ignorar os apelos dos seus próprios colegas – esquecendo que em setembro próximo deixará o cargo - será a maior responsável, evidenciando um inexplicável ódio ao Presidente que a colocou no Supremo. Mas por que tanto ódio a um homem que só lhe fez o bem? Dificil saber.
De qualquer modo, o julgamento do dia 4 de abril será a grande oportunidade para o Supremo restaurar a sua posição de guardião da Constituição e recuperar o respeito do povo. Afinal, a parcialidade das instâncias inferiores tem sido tão escandalosa que qualquer pessoa do povo já antecipa o resultado do julgamento do TRF-4 do dia 26: todos os recursos de Lula serão negados. E a Justiça está tão esculhambada que até juiz de primeira instância e procurador critica o Supremo e seus ministros, e a sua presidenta, sempre muito falante, não diz nada. Chegou a hora, portanto, da Suprema Corte recuperar a confiança do povo, não apenas repetindo em abril o placar da votação que admitiu o habeas corpus favorável a Lula como, também, evitando o cometimento de novas injustiças históricas, como a negativa de um habeas corpus para impedir o banimento de Dom Pedro II do Brasil e a autorização para que Olga Benário fosse entregue aos alemães, para ser executada. Só com uma Justiça realmente justa, sem ódio e sem partidarismo, poderão existir garantias constitucionais numa democracia como a nossa.

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