Moro não era competente para julgar Lula

A Lava Jato e as 10 maiores ilegalidades: juízo de Moro não era competente para julgar Lula. Por Joaquim de Carvalho



Nas ditaduras, quem define o local e o juiz para julgar crimes de interesse do Estado é o comandante de plantão, que manipula ou ignora as leis para garantir que, no fim do processo, se alcance o resultado previamente esperado.
É para evitar injustiças que a Constituição definiu, no seu principal artigo, o 5o., que não pode haver no Brasil juízos ou tribunais de exceção.
Quem define o juiz que julgará fatos apontados como crime é a lei, apenas a lei.
“A impessoalidade e juízo natural garantias de que não haverá perseguição”, disse ao DCM o advogado Anderson Bezerra Lopes.
A pedido do DCM, Anderson apontou o que ela considera as dez maiores ilegalidades da Operação Jato, que se tornou popular a partir de uma cobertura intensa da velha mídia e é vista como uma missão para enfrentar a corrupção no Brasil.
“Ninguém é a favor da corrupção, mas não se pode usar esse combate como pretexto para perseguições”, afirmou Bezerra Lopes.
Um dos primeiros casos em que Anderson Bezerra Lopes atuou na Lava Jato foi na equipe que defendeu Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, em 2014.
Na ocasião, ele e mais dois colegas obtiveram no Supremo Tribunal Federal uma medida que reconhecia Moro como um juiz territorialmente incompetente para julgar o caso.
Moro foi obrigado a soltar Paulo Roberto, depois que os advogados mostraram ao então ministro Teori Zavascki que a Lava Jato não poderia estar nas mãos de Sérgio Moro, pois se tratava de um processo relacionado à lavagem de dinheiro pelo doleiro Alberto Youssef, que tinha escritório em São Paulo.
Portanto, se o crime foi cometido em São Paulo, era nessa cidade, e não em Curitiba, que o processo deveria correr.
Além disso, o dinheiro era do então deputado José Janene e foi lavado em 2006, quando ele era deputado federal e, portanto, tinha foro especial por prerrogativa de função – o STF deveria autorizar sua investigação e acompanhar diretamente o trabalho da polícia.
Qual relação da investigação de 2006 com a Petrobras?
Nenhuma.
E, ainda que houvesse, a Petrobras tem sede no Rio de Janeiro e era nessa cidade que o processo deveria permanecer. Mas Moro segurou a investigação para ele.
Com que objetivo?
Só ele poderá dizer.
Mas, para se tornar o senhor da Lava Jato, manobrou a investigação da Polícia Federal já em 2006, quando soube que um deputado federal estava no centro do crime investigado.

O advogado Anderson Bezerra Lopes explica: Moro não poderia jamais estar à frente da Lava Jato

O caso é tratado no livro “Comentários a uma sentença anunciada — O Processo Lula” por um dos 122 operadores e pensadores do direito que analisaram a decisão mais famosa de Sergio Moro.
Diz o advogado João Victor Esteves Meirelles, autor do capitulo:
“Em 19 de julho de 2006, o juiz Sergio Moro deferiu todos os pedidos da autoridade policial, sem prévia manifestação do MPF e, em seguida, não abriu vista ao órgão ministerial. A próxima manifestação da autoridade policial nos autos só ocorreu quase um ano mais tarde, em 03 de maio de 2007, apenas para remeter os autos à Vara Federal, que estava sob inspeção geral ordinária (fl. 37 do inquérito nº. 2006.70.00.018662-8). O primeiro despacho abrindo vista ao MPF só ocorreu em 09 de setembro de 2008, mais de 02 (dois) anos após a abertura da investigação (fl. 47 do inquérito nº. 2006.70.00.018662-8). O conteúdo da manifestação ministerial é sintomático para que se constate a ausência de neutralidade do titular da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR na condução de uma investigação”
O Ministério Público Federal, na época representado pela antecessora de Deltan Dallagnol, viu que a PF tinha investigado muita gente e muitas empresas, mas não tinha descoberto nada relevante (a investigação “resultou infrutífera”). Por isso, a procuradora determinou que a Polícia Federal indicasse se havia algo mais a fazer. Não havendo, o inquérito deveria ser arquivado.
“Em 06 de janeiro de 2009, quase 120 dias após a manifestação do MPF e sem que a autoridade policial especificasse se havia diligências pendentes de realização, houve a juntada de uma “denúncia anônima” sob a forma de e-mail, instruída com diversos documentos (extratos bancários e uma minuta de contrato comercial). A referida “denúncia anônima” descreveu que os supostos fatos praticados pelo falecido Deputado Federal José Janene e por Alberto Youssef teriam ocorrido na cidade de São Paulo, em um escritório no Bairro Itaim Bibi, utilizado como suposta base de operações da empresa CSA-Project Finance (fls. 54-71 do inquérito nº. 2006.70.00.018662-8). Basta observar que a referida empresa foi apontada pela Polícia Federal como o centro de operações do investigado Alberto Youssef”.
Mais uma vez, Moro deveria ter enviado a investigação para São Paulo, mas ele segurou para si a investigação, sob argumento de que havia uma empresa aberta em Londrina que recebeu dinheiro de Youssef. Mas o crime, sendo lavagem, ocorria em São Paulo e também em Brasília, onde outro doleiro operou para a quadrilha de Janene.
Além disso, o dinheiro era resultado das operações de Marcos Valério, no mensalão, não havia nada relacionado à Petrobras. Por isso, o advogado, que é mestrando em direito e pesquisou os documentos mais importantes da Lava Jato, pergunta:
“Ainda que fosse procedente o argumento de que a lavagem consumada em Londrina/PR realmente tivesse alguma relação com o recebimento de vantagens indevidas em contratos da Petrobras, o que se admite apenas por amor ao debate, é de se questionar: qual a relação de tal fato com aquilo que foi objeto da denúncia oferecida contra o ex-presidente Lula?”
Não há.
Mas Moro deu um jeito de ligar os fatos, o que levou o jurista Lênio Luiz Streck, também coautor do livro “Comentários a uma sentença anunciada”, a fazer uma colocação que sintetiza o absurdo que se comete na Lava Jato:
“Em um país em que aquele que provoca tumulto em um posto de gasolina Petrobras situado em Agudo ou em Inhambu corre o risco de ser julgado em Curitiba face à competência infinita da operação ‘lava jato’ (…) Como a ‘lava jato’ pode ser competente? Sei lá. Não faço a mínima ideia. Estou apenas metaforizando. Moro sempre dá um jeito de ver e encontrar uma conexão (…) Eis a conexão para levar tudo para Curitiba. Tudo sempre está interligado, como na história do sujeito que dá uma bofetada no outro por tê-lo chamado, por dedução, de ‘corno’. Afinal, o desafeto ofereceu-lhe um pedaço de queijo. Que vem do leite. Que vem da vaca. Que tem chifres. Simples, pois”.
Moro parece o tempo todo procurar chifre em cabeça de cavalo, desde que o cavalo não seja do PSDB.
Não encontrou, mas assim mesmo condenou Lula, sem provas, sem autoridade jurisdicional, mas com respaldo das cortes superiores e, principalmente, dos grandes veículos de comunicação.
A incompetência de Moro foi questionada, assim como outras ilegalidades da Lava Jato. Mas uma decisão do TRF, o tribunal da 4a. Região (Sul), é exemplar do poder que lhe foi conferido. Há um ano, por 13 votos a 1, a corte entendeu que a Lava Jato não precisa seguir as regras dos processos comuns, pois trata de casos que “trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”.
Em outras palavras, trata-se de uma situação excepcional. Uma excepção. Um tribuna de excepção.
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PS: A ilegalidade tratada no próximo capitulo será: como a Lava Jato usurpou a competência do STF.
Para ver o vídeo em que o advogado Anderson Bezerra Lopes trata do tema da incompetência do juízo de Sérgio Moro para julgar a Lava Jato, acesse:

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