Delegado que investigava atentado à caravana de Lula diz que perdeu inquérito por razões políticas

Delegado que investigava atentado à caravana de Lula diz que perdeu inquérito por razões políticas

Lula descendo do ônibus, uma cena que se repetiu dezenas de vezes nesta caravana
O delegado Wikinson Fabiano Oliveira de Arruda estuda divulgar nota ainda hoje para rebater as razões expostas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado do Paraná para justificar a designação de outro delegado para conduzir o inquérito que apura o atentado à Caravana de Lula pelo Sul do País.
Wilkinson não está dando entrevista, mas revelou o que pensa a um grupo de policiais civis no WhatsApp, a que o DCM teve acesso. “Retirar a investigação da minha mão fere o critério de distribuição dos inquéritos no Estado. Assume o inquérito o delegado que estiver de plantão na semana, e esta semana quem está de plantão sou eu”, respondeu o delegado a um olega que perguntou se o afastamento dele tinha razões políticas.
“É claro que tem razões políticas. Não gostaram das declarações que dei sobre como vejo o crime. Foi uma tentativa de homicídio”, disse. Por quê? “Porque nós estamos diante do que se chama dolo alternativo. Quem atira contra um ônibus está querendo matar alguém. Não estou dizendo que era para matar o Lula. Mas quem faz isso, atirar em um ônibus, quer, sim, matar alguém.”
A conversa no grupo foi longa. “Dizem que o PT pode usar politicamente a declaração de que foi tentativa de homicídio. Pode, assim como o PSDB também pode usar essa ocorrência de maneira política. Para mim, por exemplo, desqualificar o crime, tirando o evidente característica de tentativa de homicídio, é politizar. Estou dizendo que, se na caravana, em vez do Lula estivesse o papa Francisco ou a Xuxa ou o pipoqueiro, eu trataria da mesma forma: tentativa de homicídio. Por que com o Lula tem que ser diferente?”, registrou.
Wilkinson, Richa e o Hélder: cúpula do governo tirou o inquérito de um delegado e o deu a outro
A linha de investigação cabe ao delegado que conduz a investigação. É o que se chama de independência funcional. Para Wikinson, a cúpula da Secretaria desrespeitou sua independência e violou a regra de distribuição de inquéritos. “Eu não estudei, me preparei e me tornei delegado para aceitar ser desrespeitado dessa forma. Estou apenas esperando ter acesso à nota da Secretaria para fazer a minha nota e me manifestar publicamente”, respondeu ele a quem estava tentando demovê-lo da tentativa de dar sua versão do afastamento.
A investigação foi para as mãos do delegado Helder Lauria, chefe da Subdivisão de Polícia de Laranjeiras do Sul, que decidiu o tratar o caso como disparo de arma de fogo e dano — crimes de menor potencial ofensivo, considerados contravenções, com penas insignificantes. Wikison disse que soube pela imprensa que o inquérito não seria mais conduzido por ele. Lauria, embora chefe da Subdivisão, não tem, em tese, poderes para chamar para si a responsabilidade pelo inquérito.
“A hierarquia é administrativa, não pode violar o critério de distribuição de inquéritos. Isso violou o caráter de impessoalidade do trabalho da Polícia. Eu já estava investigando e faria hoje a portaria para oficializar a abertura do inquérito quando soube, pela imprensa (Lauria deu entrevista à RPC, afiliada da Globo), que outro delegado tinha aberto o inquérito, violando a independência funcional da Secretaria”, afirmou.
Em nota, a Secretaria de Segurança negou o afastamento do delegado Arruda do caso. “Desde o início, das primeiras oitivas, quem conduz o inquérito policial é o delegado titular da Delegacia de Laranjeiras do Sul Helder Andrade Lauria. Arruda, que é delegado adjunto, acompanhou Lauria no atendimento ao local da ocorrência e segue dando apoio à investigação”, diz o texto. Segundo Wikison, não foi bem assim.
“Num caso de repercussão é natural que todos queiram participar. Mas, como era eu o delegado de plantão, a investigação, pelo critério de distribuição, deve ser conduzida por mim. Mas esse principio foi violado e devo explicações à sociedade”, afirmou.
Esta reportagem faz parte da série sobre a Caravana de Lula no Sul, financiada pelos leitores através de crowdfunding. As demais estão aqui

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